Wednesday, April 18, 2007

Radio Performance (take #6)

ENSAIO GRÁFICO

A performance é gráfica.

Neste caso não porque seja visível; não se trata somente do seu carácter visual. Ela é também gráfica porque, para além de visual, se trata de uma relação entre variáveis – muitas vezes ela corporaliza o ponto de encontro entre variáveis que de outro modo não se encontrariam. Utilizando o termo francês vérite, usualmente aplicado ao cinema documental dos anos 60 (?), ela é uma espécie de teatro vérite (por analogia às características aliadas ao conceito cinematográfico).

A performance provoca, suscita, promove, encontros entre elementos de universos vários que, num contexto regido pelas convenções e normas sociais, não se relacionariam.

Se ela incorpora em si variáveis, e se ela incorpora em si a relação entre elas, ela é gráfica. A performance é gráfica.

Em matemática, um gráfico é um modelo desenhado de uma relação entre variáveis. Ele apresenta-se sob a forma de dois eixos organizadores: um vertical e um outro horizontal, que representam uma variável e a que funciona em sua função; ou a correlação entre ambas – quando uma varia a outra também o faz, mas não existindo contudo uma hierarquia de dominância entre ambas.





Para exemplificar apresenta-se o exemplo seguinte (graf.1).

Neste exemplo simples, temos que X e Y estão relacionados, e que ao ponto X1 corresponde o ponto Y1.

Em contexto performático este gráfico representaria uma apresentação crescente e que no seu ponto mais alto revelaria, com toda a clareza, o que tornava relacionáveis estas duas variáveis. Este crescimento relacional poderia ser apresentado de várias formas: tons de voz, agressividade/passividade, velocidade de movimento corporal e/ou fala, ou ainda interacção com um público.

Caso existissem mais do que uma variável, então, o ponto de intercepção, ou espaço definido por várias intercepções (caso não se verifique uma única intercepção) seria o espaço performático – ou seja, o ponto de encontro entre todas as variáveis.

Dia 15 de Março de 2006, a Compagnie 72/73 apresentou no espaço da Culturgest, pelas 21h30, o projecto Climax.

O projecto, e tal como o nome indica, consistia numa apresentação de dança que buscaria um clímax de movimento, tanto ao nível da rapidez como da intensidade e força dos gestos do executante – alternandamente do sexo masculino ou feminino.

Estes factores eram apresentados tanto por um crescente da velocidade como da rudeza e definição dos movimentos, passando de movimentos mais orgânicos e líquidos, no inicio, a movimentos mais maquinais e sólidos no final.

Contudo, este clímax nunca era definitivamente atingido, o que fazia com que a qualidade dos movimentos fosse cíclica – movimentos líquidos, movimentos sólidos, movimentos líquidos... –, existiam então aproximações a um clímax que se atingido terminaria a actuação.

Esta performance torna-se então gráfica. Funciona como se fossem traçadas linhas, com sentidos ascendente e descendente, que descreveriam a variação dos factores supracitados ao longo do tempo.

No exemplo acima, tenta mostrar-se uma das possíveis relações entre o factor tempo (t) e um componente gestual – neste caso a velocidade dos movimentos (v) –; revelando o tipo de relação existente entre factores externos e factores internos (sendo que o ponto de referência se trataria do indivíduo).

Este tipo de imagem é somente um exemplo das variadas formas que a performance pode assumir – para uma visão mais completa e mais ampla teriam de ser produzidos gráficos que demonstrassem a relação entre o tempo e os diferentes componentes físicos do indivíduo: velocidade, intensidade, amplitude, etc.; de modo a cruzar a informação obtida e mostrar a relação existente, não só entre o tempo e cada um desses elementos, mas também entre cada um deles.

A um nível mais geral, qualquer performance poderia ser representada graficamente: este tipo de figura poderia ser representativa não só de uma relação em que a coordenada principal fosse o tempo, mas também o espaço; ou seja, o grafismo de uma performance revela-se essencialmente no seu contexto, na sua relação contextual, no seu molde.

Outra aplicação deste proto-modelo, pretender-se-ia com questões mais fisiológicas: interessante seria também perceber as reacções corporais internas presentes nestes fenómenos de representação (ou da não representação), bem como áreas do cérebro envolvidas, ou até que substâncias são segregadas; em última instância, perceber a fisiologia de uma performance, quais as motivações corpóreas da mesma.

Este texto não teve bibliografia na sua base, não pretende apresentar conclusões, ou qualquer outra coisa de carácter definitivo – pretende sim, fazer ver que tudo isto está na performance, na apresentação pública de um espectáculo, em cada expressão levada a cabo pelo corpo de um indivíduo; pretende sim, apresentar novos caminhos, sugestões para possíveis aproximações a esta temática, não dando uma total primazia aos seus contornos culturalmente contextuais, e não deixando de lado a vertente biológica e fisiológica do processo.

Apesar de possuir um carácter especulativo, e de ser provavelmente o menos académico de todos os textos, esta foi a minha primeira ideia para um texto sobre o tema, daí que tenha sido incluído (consciente das suas características), e que figure agora, no corpo principal do trabalho.

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